O que o meu marido pensa sobre o meu cabelo branco
Já me fizeram essa pergunta algumas vezes. Mas por que a opinião dele pode gerar mais interesse do que a minha?
Só de brincadeira, virei para o marido agora e perguntei: “O que tu achas do meu cabelo branco?”. Mas veja bem: a resposta dele não deveria interessar ninguém. Nem mesmo a mim. Ele nunca perguntou o que eu achava dos brancos dele. Eu nunca perguntei se deveria ou não parar de pintar os meus.
Ainda assim, a opinião dele interessa a algumas pessoas. Eu já tinha lido uma matéria no UOL falando sobre frases que as grisalhas estavam cansadas de ouvir. Entre os comentários de “cabelo branco só fica bonito se estiver curto” e “você é nova demais para isso”, lá estava a pergunta “o que o seu marido acha?”.
Quando chegou a minha vez de ouvir essa pergunta, quase dei risada. Em vez de perguntar o que eu acho, ou como foi o processo, ou se estou feliz com a decisão... a pessoa só quis saber a opinião dele. Mas me controlei. Respondi sem fazer cara feia.
Na lista de frases que as grisalhas ouvem também está o “não faça isso, teu marido vai te largar!”. Quero distância de alguém que me ama menos porque a cor do meu cabelo mudou ou que me larga como se eu fosse um objeto — olha a implicância com mais um verbo, além do assumir da semana passada.
Mas sei que é fácil falar que ninguém deveria ligar para o que o companheiro pensa. Deve ser ainda mais difícil parar de pintar o cabelo ouvindo o marido dizer que você não está bonita. Admirei a força da Andrea quando ela contou que até hoje o marido diz que prefere seu cabelo tingido (aqui).
A consultora de estilo Ana Soares falou com tristeza sobre a nossa necessidade de validação masculina nesse post. Ana parou de pintar o cabelo aos 39 anos, quando o parceiro disse que ela ficaria linda grisalha. E ficou. Como ela agora conta, nunca se sentiu tão bonita — estou ensaiando escrever sobre essa autoestima das grisalhas.
Daria para estender essa conversa para o corte de cabelo — “meu marido só gosta de cabelo comprido” — ou encerrar por aqui. Tem um quê de revolta na minha escolha em escrever sobre o que o marido pensa ou não sobre o cabelo branco. Mas eu realmente acabei perguntando o que o Marquinhos pensa. Era uma brincadeira. Só que percebi que a resposta dele poderia dar um empurrãozinho em outras mulheres.
“Eu adoro”, ele respondeu. Não que eu já não soubesse. Ele me incentiva desde o primeiro dia. Brincava que eu ficaria tão estilosa quanto a vampira do X-Men e sua mecha branca. Nós dois logo entendemos que o cabelo branco não seria igual aos descoloridos e prateados que eu via na internet. Não seria um branco homogêneo.
Toda noite eu rolava o Pinterest procurando alguma grisalha de verdade entre as prateadas impecáveis. Eu ainda não conhecia os perfis de grisalhas no Instagram — hoje o Pinterest nem tem mais graça. O Marquinhos acompanhou essa busca. Juntos, descobrimos que o branco era uma cor tão normal quanto o loiro ou o castanho.
“Antes eu pensava que o branco seria espevitado”, ele lembra. “Mas não. E não apenas aprendi a gostar, como hoje acho que tem mais estilo do que muitas outras opções de tintura.” Claro que, assim como eu, ele estranhou os primeiros meses. É a fase mais difícil. Mas nunca disse uma palavra que me fizesse querer desistir.
Se por um lado essa fase é esquisita, por outro havia uma recompensa imediata: parar de pintar o cabelo a cada quinze dias. Lembro como o Marquinhos ficava chocado com o desperdício de tempo. Apesar disso, nunca considerou que não pintar seria uma opção. “Parecia fazer parte da vida”, ele disse. “Igual escovar os dentes.”
Outra recompensa apareceu depois de um ano e meio. Fiquei mais amiga do espelho. O Marquinhos percebeu a mudança. “Essa decorrência do teu cabelo branco é muito massa: tu te sentes bem, estás feliz. Isso irradia”, ele disse. “Agora tu também te achas bonita. Isso faz exalar ainda mais beleza.”
Escrevi e apaguei essas duas últimas frases várias vezes. Assumir que me acho bonita? Impensável. Mas algo mudou — e a minha dificuldade em admitir me faz pensar ainda mais. Nós podemos nos achar bonitas? Ou aprendemos que mulheres que se acham bonitas estão se exibindo? O que é beleza, afinal? O que é autoestima?
Não sei responder a essas perguntas sozinha. Depois de conversar com mais grisalhas, volto para contar. Ou talvez eu pergunte para o marido o que ele pensa sobre isso. Brincadeirinha.
Um beijo,
Camila
Para admirar
Gosto de encontrar grisalhas que têm mais ou menos a minha idade. Essa é a Gabriela, que há alguns meses fez o corte pixie para dar fim à transição. Quando vejo essa foto, quase fico com vontade de cortar também. Pelo que fucei no Instagram dela, ela comemorou os 37 anos em abril. No fim do ano, será a minha vez.
Para descobrir
A jornalista Ronnie Citron-Fink sempre escreveu sobre meio ambiente, até que um dia pensou: Os produtos químicos da tintura de cabelo são tóxicos? Quais ingredientes são prejudiciais? Quem regulamenta o que os fabricantes podem incluir nas fórmulas? Para onde vai a tintura depois de despejada no ralo? Pena que o livro não tem tradução para o português — mesmo na versão para o Kindle, custa 150 reais. Alguém já tinha pensado sobre isso?
Para pensar
“Algumas pessoas se decepcionaram ao ver minha foto porque não querem romper com o mito do ícone pop (..). Os comentários negativos dizem muito mais sobre seus autores do que sobre mim.” — Suzana Alves (ex-Tiazinha), em entrevista para o UOL sobre seus cabelos brancos.
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