De onde vem os genes do cabelo branco
Meus fios me conectam à história da minha família. Mas só agora tive a ideia de começar a investigar.
Quando nasci meu pai já era grisalho. Fazia pouco mais de uma década que ele encontrara os primeiros fios brancos, por volta dos seus 20 anos. Não lembro se algum dia durante a infância pensei que meu pai era grisalho; e os pais das minhas amigas, não. Também não lembro se algum dia pensei que eu poderia ficar grisalha cedo.
Quando encontrei meus primeiros fios brancos, porém, eu sabia de onde eles vinham. Nem pensei que meus brancos pudessem ter ligação com o estresse, como mostram as pesquisas. Eu sabia que aqueles fios que apareceram nos primeiros anos da faculdade, por volta dos meus 20 anos, vinham direto da genética do pai.
Mas só agora fiquei curiosa para entender a origem dessa característica. Meu avô Chico também tinha cabelo branco? Minha avó Elody? De qual lado vem o branco? “Seu avô também era grisalho”, disse meu pai. “Mas ele sempre pintou. Nós sabíamos de qual lado da cama ele dormia porque a fronha do travesseiro ficava com marca de tinta.”
Meu pai nunca viu o cabelo natural do meu avô. Só ouviu falar. “Ele dizia que tinha cabelo branco desde novo, assim como eu”, me contou. Lembro de uma foto em que estou no colo do meu avô, quando eu tinha uns cinco anos. Até esse instante eu nunca pensara que aquela cor de cabelo poderia não ser natural — mas realmente seria estranho ele não ter nem um fiozinho branco aos 66 anos.
Minha avó também tingia. Mesmo assim, meu pai não tem dúvidas de que a genética vem do lado Balthazar, não do lado Martins da minha vó. Ele cita algumas primas que também encontraram cabelo branco com seus vinte e poucos anos. “Várias mulheres Balthazar têm cabelo branco desde cedo.”
Resolvi fazer essa pergunta para minha tia Lena, irmã do meu pai. “Aos 15 anos, eu já tinha alguns fios brancos”, ela disse. “Aos 18, penteava o cabelo para o lado que escondia a mecha branca perto da testa.” Em 1996, com 46 anos, Lena parou de tingir por um tempo. Se hoje grisalhas são exceção, imagino a revolução que ela causou nos anos 1990.
Meu pai teve três filhas. Sou a mais velha das três. Parecia certo que pelo menos uma de nós herdaria essa genética. “Qual delas vai branquear primeiro?”, ele lembra de comentar com a minha mãe, quando éramos pequenas. Fui a premiada. Minhas irmãs têm alguns fios brancos, mas eu, na idade delas, já estava tingindo. Uma tem 33, outra 30.
Um estudo da University College London, publicado em 2016, descobriu que cerca de 27% dos casos de cabelos grisalhos são hereditários — estudos anteriores falavam em até 90%, como comparado aqui. A grande diferença nesse percentual tem relação com o grupo de pessoas que participou desse estudo.
As pessoas responsáveis pela pesquisa analisaram o DNA de mais de seis mil mulheres e homens de cinco países — Brasil, Peru, Colômbia, Chile e México. Mas, diferentemente dos estudos mais antigos, que focaram apenas em descendentes de europeus, essas milhares de pessoas tinham antepassados indígenas e africanos, além de europeus.
O estudo identificou que pessoas com uma versão do gene IRF4, que regula a melanina, têm mais predisposição a ter cabelos grisalhos. Assim como outros estudos, a pesquisa também mostrou que estresse e eventos traumáticos influenciam na produção de melanina dos fios. Mas o mais interessante foi o achado de que esse gene IRF4 praticamente só apareceu nas pessoas descendentes de europeus.
Conversando com meu pai, descobri que minha bisavó paterna era alemã; meu bisavô paterno, português. Já minha bisavó materna era francesa, meu bisavô materno, Xokleng. Claro que isso não prova nada e deve ser só uma coincidência, mas meu cabelo branco vem do lado 100% europeu — e não do lado que tem etnia indígena. Curiosidade interessante, vai?
Outra coisa interessante são as reportagens publicadas sobre esse estudo da University College London. Já aviso que estou sendo irônica. O último parágrafo desta matéria do The Cut fala que a descoberta do gene IRF4 pode trazer inovações cosméticas para retardar ou reverter o grisalho. E aí vem a grande frase de fechamento: “Até que essas aplicações sejam inventadas, pelo menos temos a tinta”.
Já esta matéria do G1 traz três notícias relacionadas. São aquelas recomendações para você saber mais sobre cabelo branco, caso tenha se interessado pelo assunto. Vamos aos títulos:
Impossível não clicar na última notícia. Cabelo branco virou doença? Eu queria saber que droga prometia essa “cura”. Mas a matéria traz pouquíssimas informações sobre a tal da pseudocatalase modificada. Dei um Google. Encontrei algumas matérias aqui e ali. Descobri uns frascos à venda no Mercado Livre. Nessa mesma busca, o Google também mostrou que suco de cebola pode acabar com cabelos brancos.
Melhor voltar para a conversa com o meu pai. Ele conviveu bem com os brancos até os 40 e poucos anos. Não que tenha sofrido depois, mas uma chave virou. No fim dos anos 1990, ele se viu em uma foto e, pela primeira vez, levou um susto. “Me vi como uma pessoa idosa”, ele disse.
Depois de conversar com a minha mãe, ele decidiu cortar a barba grisalha e fazer luzes invertidas. “Vocês chamavam de trevas!”, ele lembrou, se referindo ao apelido que minhas irmãs e eu demos à técnica. Nessa mesma época, também aconteceu de ele encontrar a catequista da minha irmã enquanto passeava com ela: “Está passeando com o vovô?”, a catequista perguntou.
“Com toda a honestidade, não esquentei a cabeça. Não foram episódios que me incomodaram profundamente”, meu pai avaliou agora. “Mas escancaram como as pessoas têm a tendência a associar alguém grisalho como alguém de mais idade. Era assim que eu pensava também.”
Uns cinco anos depois, ele saiu das trevas. Mais recentemente, em 2019, pintou o cabelo de novo. Na pandemia, porém, parou. Paramos, na verdade. Ele e eu. “Cheguei a conclusão de que era uma bobagem”, ele disse. “Em 15 dias, já estava branco de novo.” Não posso discordar. A tinta não “cura” cabelo branco, afinal.
Tem um lado meu que gosta de descobrir que o meu cabelo é parecido com o do meu pai. Enquanto eu pintava, não tinha ideia. Agora vejo fotos antigas e fico comparando quem tinha mais fios brancos quando estava com a mesma idade. “O que tu achas do meu cabelo, pai?”, perguntei. “Já te falei várias vezes”, ele respondeu. “Tá charmoso. Tá muito charmoso.” Além de agradecer, só posso dizer uma coisa: são seus genes, pai.
Um beijo,
Camila.
Para admirar
Faz quatro que Revelina Tokromo parou de tingir os cabelos. Neste post da foto abaixo, ela conta que não foi fácil tomar a decisão. A primeira fase foi a negação — ela não aceitava que já estivesse grisalha. Depois veio a raiva e o cansaço de continuar pintando. Até que chegou a confiança e a aceitação. “Não se trata de como as pessoas me julgariam”, ela disse. “É como eu me vejo! Gosto que do vejo no espelho?”
Para pensar
“Envelhecer é uma bênção. Cabelos grisalhos são sinais de sabedoria. Rugas são sinais de que você riu. Marcas na barriga são sinais belos e milagrosos de que você deu à luz. (…) Envelhecer, estar AQUI, é maravilhoso.” — Tia Mowry, atriz e produtora executiva, neste post no seu perfil do Instagram.
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