Você é ou conhece uma grisalha da quarentena
Só eu imagino que veremos mais mulheres com cabelo branco depois da pandemia?
Talvez você não seja, nem conheça uma grisalha da quarentena. Talvez eu esteja exagerando. Já dei muito Google para descobrir se o número de grisalhas aumentou durante a pandemia. Encontro muitas matérias sobre o assunto, mas nenhuma pesquisa relevante. Talvez seja muito cedo para termos esses resultados.
Em entrevista para o UOL, a gerente de marketing de produtos da L’Oréal Professionnel disse que não tem dados recentes sobre esse novo mercado (mas perceba que ela o chamou de “novo”). O último estudo, de 2018, mostrava que cerca de 5% das mulheres deixavam os cabelos brancos (só?!). Por outro lado, ela conta que a venda de produtos para grisalhos aumentou dois dígitos.
Fiquei curiosa para saber se os cabeleireiros estão notando alguma diferença na clientela. Telefonei para o Marcello Pascotto, hairstylist do salão L’Officiel, de São Paulo. “De um universo de cerca de mil clientes, sabemos de quinze mulheres que deixaram de colorir os cabelos”, ele disse. “Mas esse número pode ser maior porque muitas ainda não voltaram para o salão.”
Se quinze parece pouco, antes da pandemia era quase zero. “Acredito que muitas até gostariam de deixar o cabelo natural para ver como ficaria, mas tinham receio da resposta social. Como o salão ficou fechado por alguns meses, elas decidiram experimentar. Afinal, em último caso, é só pintar de novo.”
Pesquisei alguns salões de beleza antes de decidir com quem conversar. A maioria não posta grisalhas no Instagram — só loiras, ruivas e castanhas com cabelos ondulados por baby liss. Em vários deles, o único cabelo grisalho é o do próprio cabeleireiro.
O perfil do L’Officiel no Instagram tinha uma ou outra grisalha. Durante a conversa com o Marcello, descobri que uma delas era sua esposa. “Ô, Ellennnnnn!”, ele gritou. “Vem aqui contar porque você decidiu parar de pintar o cabelo!”
Ela contou que queria ter menos trabalho — “e olha que tenho um cabeleireiro em casa!”, disse, rindo — e se livrar da alergia às tintas, que irritavam o couro cabeludo mesmo quando eram produtos sem amônia e misturados com algum antialérgico.
Depois de uns quatro meses sem pintar, Ellen entrou naquela fase difícil, que dá vontade de desistir. “O estranho da transição é que fica entre dois mundos por um tempo”, disse Marcello. “Nem grisalho, nem tingido.” Ele começou a sugerir um corte bem curtinho para Ellen. Resistente à ideia no início, ela acabou topando.
“Nunca imaginei que fosse gostar tanto do curto e do branco”, disse Ellen. “Às vezes, olho uma mecha mais branca e penso: ‘Por que não está tudo branco ainda?’ Pego esse pedaço do cabelo e deixo bem à mostra. Passo cera para marcar o branco. Nunca imaginei isso!” Por enquanto, ela não tem planos nem de voltar a pintar o cabelo, nem de deixá-lo crescer.
A foto da Ellen (acima) mostra por que o corte é uma das formas mais rápidas de passar pela transição. Resolve em poucos meses. Há quem prefira descolorir todo o cabelo tingido, para harmonizar a cor com a raiz branca ou grisalha que vai nascer. “Não recomendo essa possiblidade”, disse Marcello. “Agride muito o cabelo.”
Ainda assim, a opção é tentadora. Pensei em fazer isso várias vezes, mesmo sabendo que o meu cabelo não sobreviveria à descoloração. Cheguei a mandar mensagem para um cabeleireiro para agendar o processo. Quando ele respondeu, eu já tinha mudado de ideia. Já o corte nem gerou dúvidas — para mim, seria tão difícil quanto lidar com os brancos.
Já que posso trabalhar de casa durante a quarentena, preferi esperar o cabelo crescer (e continuo esperando…). Se tivesse que frequentar reuniões e eventos sociais, não sei qual teria sido a decisão. O que sei é que a conversa com o Marcello e a Ellen só aumentou meu viés para enxergar o aumento das grisalhas na quarentena — até a esposa do cabeleireiro deixou o cabelo branco!
Desconfio que o mundo pós-pandemia questionará alguns padrões de beleza. Ou pelo menos abrirá o caminho para pequenas mudanças. Mas, de novo, talvez eu esteja exagerando e você nem seja, nem conheça uma grisalha da quarentena. Talvez seja só eu aqui pensando tanto em cabelo branco que estou até escrevendo sobre isso. Qual é o teu palpite?
Um beijo,
Camila.
Para admirar
Lyn Slater era professora universitária, mas foi confundida com uma celebridade quando estava do lado de fora de um desfile de moda. Vários paparazzi a cercaram. Assim nasceu o blog “Accidental Icon” — e hoje ela mostra para os seus mais de 750 mil seguidores no Instagram que roupa não tem idade, cabelo não tem idade...
Para assistir
O documentário Branco e Prata (assista aqui) entrevistou mulheres de diferentes idades sobre o que significa ter cabelos brancos. Entre várias discussões interessantes, me diverti com essa cena da foto. A senhora da direita é a mãe; a da esquerda é a filha. A mãe não se conforma — “ela é muito jovem pra ter esse cabelo tããão assumido!”.
Para pensar
“Não me sinto confortável em ser identificada como a mulher de cabelo grisalho. Não saí da caixa de ‘tingidas’ para entrar em outra caixinha, a da ‘grisalha’. Eu não sou apenas isso. Até porque amanhã posso acordar com vontade de pintar o cabelo — e tudo bem! Esse é o barato, a grande libertação: de pintar ou não o cabelo porque tem vontade, não para se encaixar em padrões.” — Valéria Rossatti, empresária e modelo, em entrevista para a revista Marie Claire.
Me conta se você é a grisalha ou conhece a grisalha da quarentena? E quais reflexões isso gerou? Deixa um comentário no post ou responde esse e-mail :)
Sou uma grisalha da quarentena. Queria parar de pintar e não tinha coragem. Na quarentena pensei: é agora ou nunca e então parei de pintar. Hoje, 1 ano e 2 meses depois da última tintura estou muito feliz com a minha decisão. Me sinto livre.
Olá! Estou sendo uma grisalha da quarentena, pois parei de pintar tem 3 meses. Já vinha amadurecendo essa idéia bem antes da quarentena, mas agora assumí! Estou me amando independente do que pareço para os outros… relaxada e etc…afinal não dependo da opini de ninguém pra viver o que escolho pra mim. A sensação de liberdade vale bem mais do que a da vaidade, afinal ser vaidosa é um conjunto, um todo e não apenas o cabelo. Acrescento tb a gentileza, amorosidade, bom humor, alegria e por aí vai…… são 65 anos de muito aprendizado e hj necessidade de me sentir LIVREEEEE